terça-feira, 14 de novembro de 2017

SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO, CAPÍTULO I.





CAPÍTULO I, Exórdio

No primeiro parágrafo do Cap. I faz-se a apresentação do tema, de toda a problemática que vai ser desenvolvida ao longo do Sermão. O argumento é, por sua vez, desenvolvido em redor do Conceito Predicável,

Vos estis sal terrae, Mateus, 5

retirado da Sagrada Escritura.

Explicitação do C.P..

Vos (Vós) - referente aos pregadores cuja função é impedir a corrupção e a quem Cristo chama sal  exatamente por esse motivo.

estis (sois)

sal (o sal) - mensagem veiculada através da cristianização, da transmissão dos valores religiosos

terrae (da terra) - referente aos Índios, aos homens em geral.

Padre António Vieira (PAV) interroga-se, se existem tantos na terra com o ofício de sal, qual será a razão para a existência de tanta corrupção?

E, continuando a desenvolver a sua argumentação, coloca hipóteses...

e qual a causa da corrupção? as causas são várias e são apresentadas por uma sequência de orações coordenadas disjuntivas ( ou) :



Ou porque o sal não salga
1)→ os pregadores não pregam a verdadeira doutrina
2)→ os pregadores dizem uma coisa e fazem outra
3) → os pregadores não pregam a verdadeira doutrina
Ou porque a terra não se deixa salgar
1)→ os ouvintes não querem receber a verdadeira doutrina
2)→ os ouvintes preferem imitar o que os pregadores fazem a fazer o que eles pregam (pressupõem-se que os pregadores também não fazem o que deviam e o que pregam)
3)→ os ouvintes servem (agradam) os seus apetites e não a Cristo.

Conclusão: Não é tudo isto verdade? – • Interrogação retórica – tanto é verdade que a resposta é: Ainda mal!


Na hipótese de tudo o que foi dito ser verdade (suposto pois...), como modificar a situação?

→ aos pregadores, se faltarem à doutrina e ao exemplo:
→ Deitá-lo fora, para ser pisado por todos
→ e à terra? [àqueles que estão a ouvir o sermão]→ dá o exemplo de St António
Mudou de púlpito (lugar onde pregava) e de auditório (ouvintes do seu sermão)
↓                                                      ↓
Foi pregar para a praia                              aos peixes
Vieira faz o mesmo (linha …) → vai  pregar aos peixes.
Alegoria: conjunto de imagens que mostra uma realidade com significado simbólico



O que deve então ser feito se o sal não salga?

Deve ser lançado fora como inútil para que seja pisado de todos.   (Cap. I)

E o que se deve fazer à terra que não se deixa salgar?
Ainda que Cristo não tenha deixado nada determinado sobre esta hipótese, diz PAV que se deve então seguir o exemplo de Santo António...

Encontrando-se Santo António a pregar em Itália na cidade de Arimino, contra os Hereges, e tendo-se o Povo revoltado contra ele, decide o Santo mudar o púlpito e o auditório sem, no entanto, abandonar a doutrina.~
Assim, deixa Santo António as praças - a cidade - e os Hereges - os ouvintes, homens - e dirige-se para o mar, as praias, onde o esperam ouvintes mais atentos, os peixes. Santo António foi, deste modo, sal da terra e sal do mar.
Imitando o Santo, PAV justifica a sua opção acrescentando que, já que os homens não aproveitam as suas palavras, então resta-lhe a atenção dos peixes.
O primeiro capítulo termina com a habitual invocação a Maria, Domina maris, isto é, Senhora do mar.

Notas Soltas...

Exórdio (ou introito) – capítulo I – apresentação do tema que vai ser abordado no sermão, tendo por base o conceito predicável e as ideias a defender e que, geralmente, termina com uma breve oração, invocando a Virgem. Esta primeira parte é muito importante uma vez que nela se decide a eficaz captação da atenção dos ouvintes.

O Sermão é um texto em prosa, um discurso importante, longo e demoradamente elaborado. Tem como objetivo a propaganda / edificação religiosa.

Faz parte da oratória, arte ou prática de bem dizer. Explora os recursos verbais procurando ensinar, persuadir e comover.

Característica do orador: tem de se expressar com desenvoltura e persuadir através da palavra.

Função do púlpito – a figura do pregador nas igrejas é centralizadora, ocupa uma oposição estratégica.
O pregador detém o poder da palavra, conhece o texto bíblico, é o elemento agregador do grupo, fortalece-o e condu-lo. Como orador, ele ocupa uma posição destacada e o púlpito constitui um ponto de observação.
O púlpito sobreleva o papel dele como sacerdote, é ele quem escolhe o texto do Evangelho a ser lido, as vestes que irá usar.
Entre o pregador e o público há uma relação desigual sendo que a distância que separa o púlpito do público é igualmente uma barreira.

O orador interpreta o texto divino e, através das suas palavras, e o auditório nota que Cristo disse algo… Vieira torna-se assim o próprio porta-voz de Deus e aos ouvintes resta apenas ouvir e acreditar.

Citações em Latim – são imprescindíveis nos sermões de Vieira embora não seja necessário que sejam compreendidas pois o orador traduz estas citações. Elas fazem parte da mentalidade da época; transformam em verdades as afirmações do presente pois confirmam-nas.

A escrita seiscentista assenta esteticamente num jogo, é um jogo…
Jogo de palavras com os seus trocadilhos ou equívocos;
Jogo de imagens de diversos tipos com que se embeleza, se transforma a realidade.
Jogo de construções, com que se organiza a frase e se molda o pensamento dentro de modelos predeterminados – simetrias, paralelismos, cruzamentos, antíteses, alternâncias, enumerações e suas repetições.



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