domingo, 29 de junho de 2014

"TER QUE" ou "TER DE"?



Embora não seja um erro considerado grosseiro, a verdade é que não me passa indiferente ao ouvido  :).
 
TER QUE e TER DE não podem ser utilizadas indistintamente do mesmo modo que dizer
 
Tenho de comer mais vegetais.
 
 e
 
Tenho que comer no frigorífico.
 
 
representam ideias diferentes.
 
Assim, na primeira frase, está implícita uma ideia de obrigatoriedade, um dever, uma obrigação (naturalmente, em defesa da própria saúde) enquanto que na segunda está indicada uma disponibilidade para algo.
 
 

sexta-feira, 27 de junho de 2014

NOTAS A PROPÓSITO DO ROSACRUCIANISMO

 
 
 
Rosacrucianos
 
Os rosacrucianos propõem a defesa da fraternidade universal entre todos os homens.
 
Para os rosacrucianos, os homens podem desenvolver as suas potencialidades para se tornarem melhores, mais sadios e felizes.
 
O rosacruciano tem por objetivo primordial levar o homem ao autoconhecimento e à manifestação da sua real natureza espiritual.
 
Estes objetivos, segundo os rosacrucianos, podem ser atingidos por meio de uma mudança pessoal, de hábitos, pensamentos e sentimentos. Segundo eles, isto só é possível se se dissipar o véu que cobre os olhos dos homens.
 
A recompensa dos que atingem este objetivo que é de natureza espiritual, é uma paz consigo próprio; este estado irradia do indivíduo e atinge todos quantos se encontram à sua volta, produzindo neles um reflexo positivo.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 


terça-feira, 24 de junho de 2014

DESAFIO: VAMOS PONTUAR?


 
Para pontuar, existem duas regras importantes:
 
1 - nunca se separa o sujeito do predicado;
2 - nunca se separa o complemento direto do verbo.
 
Antes das regras, sempre tão enfadonhas ainda que esclarecedoras, umas brincadeiras...
 
 
1 - Pontue convenientemente os seguintes textos de modo a torná-los compreensíveis:
 
a) Um lavrador tinha um bezerro e a mãe do lavrador era também o pai do bezerro.
 
b) Deixo os meus bens a minha irmã não a meu sobrinho jamais será paga a conta do alfaiate nada aos pobres.  (Há 4 interpretações possíveis.) 
 
1.1 - Um homem foi condenado à morte. A sentença tinha só duas frases. O rei era bom e deslocou um dos sinais de pontuação, salvando o homem. Que fez ele?
 
a) perdão impossível que cumpra a pena
 
1.2 - Pontue o texto de modo que obtenha sentimentos opostos:
 
a) ressuscitou não está aqui
 
 
 
 
[soluções a publicar]
 
 

segunda-feira, 23 de junho de 2014

DEVEMOS DIZER...





Devemos dizer "página vinte e um"; então também devemos dizer "vinte e uma página"?

Assim como se deve dizer página vinte e dois uma vez que o numeral, colocado depois, concorda neste caso com a palavra "número", omissa, o mesmo sucede na expressão "página vinte e um" (número vinte e um, que representa a ordem da página.

Já o mesmo não sucede quando estamos a referir-nos à quantidade de páginas, com o numeral colocado antes. Deve-se, neste caso, estabelecer a concordância entre a grandeza avaliada e o numeral que representa essa medida,

Exemplo: “vinte e dois jogadores no plantel”

Logo, devemos dizer: vinte e uma páginas – “uma” porque página é do género feminino; “plural” em páginas porque são várias.

Não dizer, atenção, “vinte e uma página” pois é incorreto… os símbolos não têm plural e se considerarmos “página” uma unidade de medida do volume de um livro, em páginas, e do mesmo modo que dizemos “vinte e uma horas”, devemos também escrever vinte e uma páginas.

 

O TEXTO EXPOSITIVO-ARGUMENTATIVO




O texto expositivo-argumentativo

 

Antes de mais, é necessário sabermos distinguir as noções de facto, opinião e argumentação.

Assim, um facto é um acontecimento, uma constatação real; uma opinião emite um juízo de valor, uma convicção pessoal e, como tal, passível de discussão; a argumentação consiste em fazer valer as nossas opiniões, as nossas convicções, fundamentando-as e tentando persuadir o(s) nosso(s) interlocutor(es).

A produção de texto expositivo-argumentativo pressupõe a formação de juízos de valor sobre um determinado tema ou assunto, apresentando as razões a nosso favor, que irão conduzir à argumentação.

Argumentar é, pois, persuadir o nosso interlocutor do ponto de vista que defendemos, o que implica recorrer a estratégias discursivas adequadas à defesa desse ponto de vista. Para tal, devemos utilizar um discurso correto, assente na clareza e na objetividade, na coerência e na sequencialização.

Dado que o texto expositivo-argumentativo se reveste de um carácter pessoal, devemos emitir as nossas opiniões obedecendo a determinadas regras de organização de texto, de modo a torná-las bem explícitas. Daí que se inicie o texto a produzir por uma curta introdução do tema ou assunto a tratar. De seguida, desenvolvemos os nossos pontos de vista (argumentos em nosso favor), corretamente organizados em parágrafos e interligados pelos conectores de discurso. Por fim, passamos à conclusão, que deve sintetizar as ideias essenciais.

Consideremos, então, as etapas a percorrer para elaborar uma argumentação:

  • Reflexão - em primeiro lugar, é necessário refletirmos sobre o tema ou assunto em questão. Podemos fazer anotações sobre os aspetos que pretendemos focar, nomeadamente os que são a favor e contra, para, assim, se tornar mais fácil o nosso trabalho.
  • Organização do texto - estamos, então, na fase da organização do texto que deverá refletir a nossa opinião pessoal. Esta terá que ser muito bem fundamentada e argumentada, utilizando o máximo de argumentos a favor. A argumentação feita deve ser de tal modo persuasiva que faça crer que o nosso juízo de valor é o único aceitável.
  • Redação - depois de percorridas as etapas anteriores, podemos redigir a nossa introdução; nela devemos equacionar o tema, o nosso ponto de vista e, se assim o entendermos, a metodologia que vamos utilizar. Esta introdução, apesar de redigida no final, é colocada no início do texto.

 

Para concretizar o texto expositivo-argumentativo é necessário:

      • ter conhecimentos do tema/assunto a tratar;
      • ter ideias, opiniões, factos;
      • ter argumentos e provas em nosso abono.

 

Para uma boa exposição e argumentação é conveniente conhecer os articuladores do discurso.

 

In Português B, O essencial do 12º ano, Edições ASA

sábado, 21 de junho de 2014

ERROS DE LINGUAGEM MAIS FREQUENTES (1)


DIGA-SE!


NÃO SE DIGA!



1 - acerca disso - à cerca disso

2 - a gente vamos - a gente vai, nós vamos

3 - a maior parte deles foi - a maior parte deles foram

4 - amizade / amor por alguém - amizade / amor a alguém

5 - apresentar uma dúvida - colocar uma dúvida

6 - colocar uma questão - fazer uma pergunta; perguntar

7 - mal empregada (coisa mal) - mal empregue (coisa mal)

8 - semear batatas - plantar batatas



***  mandar alguém plantar batatas = mandá-lo bugiar







sexta-feira, 20 de junho de 2014

DIGA-SE: "ANTES QUERO"; "AO ENCONTRO DE" E "DE ENCONTRO A"



ANTES QUERO - ao contrário do que muitos defendem, não é um erro. Errado é dizer "antes prefiro" pois na palavra "antes" já existe o sentido de "primeiro que, ou seja, de preferência. Assim, em *antes prefiro há uma redundância.
 
 
DIGA-SE:
 
ANTES QUERO
 
ou simplesmente
 
PREFIRO
 
 
 
 
 
AO ENCONTRO DE / DE ENCONTRO A - erro inaceitável a expressão *vir de encontro a uma ideia porque *ir de encontro significa choque
 
Ex: O carro veio de encontro à minha casa.
 
diferente de
 
Ex: Essa ideia vem ao encontro da minha opinião.
 
 
 
 
 
 

terça-feira, 17 de junho de 2014

A LÍNGUA PORTUGUESA: DAS ORIGENS AOS NOSSOS DIAS



1. Línguas de Substrato (antes da Romanização / do Latim)


- Celtas - suf. briga...

- Fenícios - mapa...

- Gregos - época, papel, carta...



** A influência grega foi também muito significativa noutras épocas, ao longo dos tempos.

- na época da romanização, com os nomes das ciências - Filosofia, Gramática, Geometria, Aritmética...

- Cristianismo - igreja, anjo, parábola...

- do século XVIII aos nossos dias:

. na formação de palavras de índole científica a partir de radicais gregos - democracia, anarquia, política, biologia...

. compostos de:

.. hemo (sangue)
.. pneumo (ar)
.. cine (movimento)
.. fleb (veia)
.. foto (luz)
.. tele (distância)



2. Línguas de Superstrato (depois da Romanização / do Latim)

- Visigóticos (475) d.C.: luva, sopa, barriga

. Toponímia - Armamar, Mangualde...

. Onomástica - Fernando (corajoso na paz), Berta (claridade), Guilherme (vontade)...

- Árabes (711 d.C.): cultura superior

. agricultura - arroz, tremoço, azeitona, ceifa, nora, azenha...

. pesos e medidas - almude, alqueire, arroba...

. construção das casas - alicerce, andaime..., adobe

. ciências - algarismo, álcool, alquimia, zénite...

. atividades domésticas - taça, alcatifa, jarro, alfinete...

. culinária - acepipes, almôndegas, escabeche...

. vestuário - samarra

. toponímia - Fátima, Almada, Alcântara...

(palavras em al-)




IDADE MÉDIA 


. Latim (era a língua culta, dos documentos)

      família, palácio (por via culta)

. Francês e Provençal (terminação em -agem...)


RENASCIMENTO

. Latim (via erudita)

. Italiano

! artes - fachada, fresco, aguarela, caricatura...

! música - ópera, piano, serenata...

! vida mundana - figurino... .



DESCOBRIMENTOS


Foram importadas muitas palavras relacionadas com produtos, fauna, flora e costumes das regiões descobertas:

. África - macaco, banana...

. China - chá, chávena...

. Japão - quimono...

. Brasil - arara, acaju, jacaré...

. Pérsia - bazar, laca, xadrez...

Muitas destas palavras designam-se por "palavras de civilização" pois entraram com o  objeto.

. Castelhano - (lit. do século XVI)

guitarra - mantilha...
chocolate - tabaco - baunilha (recebidas das línguas indígenas da América)
 
 
 
 
SÉCULOS XVII E XVIII
 
 
. Inglês - antílope, rum, pinguim...

. Francês - flanela, blusa, restaurante, embaraçar


Serviu de veículo transmissor de palavras vindas de outras línguas:

. Alemão - edredon, valsa, aspirina...

. Línguas Eslavas - iogurte, estepe...

. Inglês - eletrão, celuloide, parlamento, oposição, congresso...




SÉCULOS XIX E XX


. Francês - socialismo, esquerda, direita (novas realidades políticas)

. Italiano - fascismo, analfabetismo...

. Inglês da América - jazz, cocktail, filme...





Conclusão:

 
O português, como qualquer língua, está em permanente evolução, adaptando-se, deste modo, às necessidades de cada época. Atualmente, a evolução é muito mais rápida graças aos meios de comunicação.



Arcaísmos - vocábulos que caíram em desuso.

Neologismos - vocábulos novos que surgem na imprensa, nos textos literários,...  no domínio, por exemplo, da linguagem técnica e científica:

                 - oftalmologia, construtivismo, ONU...


. Estrangeirismos - vocábulos de origem estrangeira que são adotados na língua portuguesa

                  - anglicismos - bar, clube, futebol...

                          - francesismos ou galicismos -  guichet, brevet, panne, cassette...

segunda-feira, 16 de junho de 2014

"FELIZMENTE HÁ LUAR!" - PARALELISMO ENTRE DUAS ÉPOCAS


TEMPO DA HISTÓRIA - SÉCULO XIX - 1817

TEMPO DA ESCRITA - SÉCULO XX - 1961

 
. agitação social que levou à revolta liberal de 1820 - conspirações internas; revolta contra a presença da Corte no Brasil e a influência do exército britânico.
 
. agitação social dos anos 60 - conspirações internas; agravamento da guerra colonial.
 
. regime absolutista e tirânico;
 
. regime ditatorial de Salazar.
 
. hierarquização marcante das classes sociais e receio por parte das classes dominantes de perderem privilégios.
 
. desigualdade social entre abastados e pobres; classes dominantes veem o seu poder reforçado.
 
. povo oprimido e resignado; a miséria, o medo e a ignorância; obscurantismo, mas "felizmente há luar".
 
. povo reprimido e explorado; miséria, medo e analfabetismo; obscurantismos, mas crença nas mudanças.
 
. luta contra a opressão do regime absolutista; a personagem Manuel, "o mais consciente dos populares", denuncia a opressão e a miséria.
 
. luta contra o regime totalitário e ditatorial; agitação social e política com militantes antifascistas em protestos.
 
. perseguições dos agentes de Beresford; as denúncias de Vicente, Andrade Corvo e Morais Sarmento que, sem escrúpulos e hipócritas, denunciam  quem se manifesta contra o poder instituído, censura à imprensa.
 
. perseguições da PIDE; denúncias dos chamados "bufos" que, disfarçados e escondidos na sombra, procuram colher informações para, posteriormente, denunciar; censura.
 
. severa repressão dos conspiradores; processos sumários e pena de morte.
 
. prisão e duras medidas de repressão e de tortura; condenação em processos sem prova.
 
. execução  do general Gomes Freire, em 1817.
 
. posterior a "Felizmente há Luar!" - execução do general Humberto Delgado, em 1965.
 
 
 
 
 
 

domingo, 15 de junho de 2014

"OS LUSÍADAS" e "MENSAGEM" - Síntese (parte II)




     Os 44 poemas que constituem a Mensagem encontram-se agrupados em três partes:
 
- Primeira parte - Brasão (os construtores do Império)
 
     : corresponde ao nascimento, com referência aos mitos e figuras históricas até D. Sebastião, identificadas nos elementos dos brasões. Dá-nos conta do Portugal erguido pelo esforço dos heróis e destinado a grandes feitos.
 
- Segunda parte - Mar Português (o sonho marítimo e a obra das descobertas)
 
     : surge a realização e a vida; refere personalidades e acontecimentos dos Descobrimentos que exigiram uma luta contra o desconhecido e os elementos naturais. Mas, porque "tudo vale a pena", a missão foi cumprida.
 
- Terceira parte - O Encoberto (a imagem do Império moribundo, a fé de que a morte contenha em si o gérmen da ressurreição, capaz de provocar o nascimento do império espiritual, moral e civilizacional. A esperança do Quinto Império).
 
     : surge a desintegração, havendo, por isso, um presente marcado pelo sofrimento e pela mágoa visto "faltar cumprir- -se Portugal". É preciso acontecer a regeneração, que será anunciada por símbolos e avisos.
 
 
 
 
!   Mensagem recorre ao ocultismo para criar o herói - O Encoberto que se apresenta como D. Sebastião.
O ocultismo remete para um sentimento de mistério em que só o detentor do privilégio esotérico - = oculto / secreto - tem legitimidade para realizar o sonho do Quinto Império.
 
!   O Ocultismo:
- três espaços, o histórico, o mítico e o místico;
- "A ordem espiritual no homem, no universo e em Deus";
- Poder, inteligência e amor na figura de D. Sebastião.
 
!   A conquista do mar não foi, afinal, suficiente pois o império material desfez-se, isto é, a missão ainda não foi cumprida: falta concretizar o novo sonho, um império espiritual.
 
!   A construção do futuro, a revolução cultural, tem de ter em conta o presente mas aproveitando as lições do passado, fundamentando-se nas tradições ancestrais.
 
!   Em Mensagem surgem diversos mitos, nomeadamente o do Sebastianismo e o do Quinto Império. É possível também perceber outros mitos como o do Santo Graal ("Galaaz com pátria" era o Desejado, capaz de permitir o regresso do Graal, o símbolo da união e harmonia entre os povos), o das Ilhas Afortunadas (de "terras sem ter lugar", como o Quinto Império) e o do Encoberto (dentro da mística rosacruciana em cujos princípios se deveria basear o Quinto Império). A conceção mítica leva também Pessoa a usar figuras como Ulisses e o Mostrengo, que o ajudam a explicar o passado dos Portugueses e a defender a sua missão profética.
 
!   Em Mensagem, os poemas, em geral breves, apresentam uma linguagem metafórica e musical, com predominância de frases curtas, apelativas e, muitas vezes, aforísticas, onde abundam a pontuação expressiva e as perguntas retóricas.
A voz lírica reflete sobre o passado heroico de conquistas, vibrando com o espírito do povo português e adquirindo um tom profético.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

domingo, 8 de junho de 2014

"Tabacaria" de Álvaro de Campos - análise do 4º momento / 4 momentos



Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
Álvaro de Campos, 15-1-1928



A visão de um homem - talvez um cliente - que entra na Tabacaria

Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.

traz o eu-poético de regresso à realidade e à vontade eufórica de voltar a escrever.

Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.

Esse homem é o Esteves (tal como é referido mais à frente no poema quando o mesmo sai da loja) o qual desperta no eu um sincero desejo de mudança.
E porquê?
Questão a que responderemos já de seguida...

Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.

Após o momento de euforia inicial o eu-poético mergulha na reflexão, na Inércia, interessado apenas em saborear o cigarro que entretanto tinha acendido.


E porquê? foi a questão que deixámos em aberto há pouco...

O Esteves representa o apelo de uma vida simples, sem reflexões, vivida apenas no decorrer das coisas e dos dias.
E será esse sentimento que levará o eu-poético a considerar se não teria sido mais feliz se tivesse casado com a filha da lavadeira, tornando-o num homem como o Esteves, um homem comum e sem grandes inquietações, que aceita o real. Mas a sua presença obriga o sujeito poético a regressar à sua condição anterior, isto é, à certeza de que tudo é inútil, de que tudo se perde no nada e de que o destino se cumpre no sorriso do dono da Tabacaria, alheio a tudo.
É esta também a conclusão do poema.


(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.


..........................................

Seguem-se algumas ideias que importa aqui reforçar.

- os quatro momentos do poemas estão relacionados com os espaços físicos onde se desloca o sujeito poético, o Interior ou Dentro representado pelo quarto e pela cadeira e o Exterior ou Fora, pela janela. Esta permite-lhe o contacto com o exterior, com a rua e com a porta da Tabacaria.

- o pessimismo é nota dominante neste texto, cuja ideia se encontra, por sua vez, ligada, ao desgaste do Tempo e àquilo que se tem como realmente certo, a Morte.

- a negatividade do eu  é assumida através da anáfora presente no início dos versos

Estou hoje vencido;
Estou hoje lúcido;
Estou hoje perplexo;
Estou hoje dividido.

e, em jeito de resumo,

Falhei em tudo.