quarta-feira, 1 de junho de 2016

O GEBO E A SOMBRA - ATO I




Clara Nunes Correia
A Negação do Tempo, UNL

Reler os textos de teatro obriga a uma auto-disciplina. Não são fáceis nem divertidos.

A condição humana é retratada de forma crua, as personagens são construídas rigorosamente para existirem sempre.





Em O Gebo e a Sombra o tema dominante é a pobreza.

A pobreza associada à desgraça e à desonra, ou antes, a pobreza como contrapartida para conservar a honra e a honestidade.

No Ato Primeiro, o espaço é uma casa pobre. Intervêm Gebo, Doroteia e Sofia; esta última é mulher de João, filho do casal, o qual se encontra desaparecido há 8 anos.

Sem certezas declaradas, são várias as hipóteses colocadas para explicar este desaparecimento: talvez esteja preso, talvez ande fugido, talvez "ande a monte". Raul Brandão não nos conta a verdade, não dá a conhecer a realidade, a verdade, apenas faz alusão à situação.

Só Sofia e Gebo conhecem a verdade e é esse o seu fardo, o que os faz sofrer, podemos quase afirmá-lo, a sua sombra. Esta é também a verdade que nos ilude sempre.

Gebo e Sofia mentem a Doroteia, a Mãe, aquela que acredita que o seu filho é um "bom menino", o mesmo que emigrou para ganhar a vida e sair daquela pobreza.

Gebo não fala, não diz nada e foge às perguntas de Doroteia; no entanto, sofre quando afirma não saber nada de João. Procura refúgio nas suas contas, nos livros de contabilidade que são o centro do seu trabalho.

Sofia também sofre: com o sofrimento em que imagina o seu marido, com o sofrimento do velho a quem chama Pai, com o seu próprio sofrimento e com a mentira que é a raiz da pobreza.