quinta-feira, 11 de maio de 2017

"OS MAIAS": SIMBOLISMO / ELEMENTOS SIMBÓLICOS - 4ª PARTE





Afonso recebe, por Vilaça, a notícia do casamento de Pedro, com o qual não concordara, e quando se senta “à mesa do almoço posta ao pé do fogão” vê que “ao centro um ramo esfolhava-se num vaso de Japão, à chama forte da lenha”. Isto pressagiava o fim do “romance” de Pedro e Maria Monforte pois este enlace iria desfazer-se e desaparecer, como aquelas folhas secas que à chama forte da lenha se esfolhavam no vaso de Japão. E Pedro, um dos Maias, separar-se-ia depois, pelo suicídio, do tronco familiar.

Carlos com um profundo sentimento de culpa dirige-se da Rua de S. Francisco para o Ramalhete pensando que, depois de ter cometido o incesto consciente, é-lhe impossível recomeçar a sua vida, tranquilamente, na presença do avô e de Ega.

No momento da chegada de Carlos ao Ramalhete, no exterior “os candeeiros ainda ardiam”, porém o advérbio de tempo “ainda” indica que a escuridão está prestes a acabar, dando lugar à luz do dia. Mas no interior reinava a escuridão, e Carlos procurava uma luz para iluminar os seus passos e o seu comportamento, é que moralmente sentia-se também às escuras.

Neste momento de hesitação surge o avô com uma luz, manifestada primeiro como claridade que vai crescendo, e depois se torna num clarão, numa luz bem definida. Podemos descortinar nesta luz um simbolismo: o avô sempre representou a luz, uma luz para Carlos que lhe dissipava os momentos de incerteza e o orientava na vida. Mas agora “estava lívido”, descorado pelas dúvidas, os seus olhos estavam vermelhos, não só por ter passado a noite em claro, mas pelo sofrimento. A luz de antigamente apagara-se e agora o avô não se encontrava ali para orientar mas para pedir contas, para recriminar.

A luz do avô agora assustava Carlos porque este, cedendo ao prazer pecaminoso, tornou-se cúmplice do mal e do poder das trevas. Não admira que entrasse no quarto às escuras, sem rumo, desorientado, tropeçando num sofá, sem saber o que fazer. A imagem do avô ficou gravada no neto, sobretudo através de duas cores: o lívido do rosto e o vermelho da vela e dos olhos, ambas de natureza negativa que apontam para a morte. A partir desta confrontação, a vida perdera todo o sentido para ele.

Foi preciso ser anunciado o sol e a luz do dia para ele reagir a este estado depressivo que o dominava e adormecer. Através da evasão do sono, logrou fechar as portas à luz do dia e da razão, e mergulhar na escuridão que é o antegosto da morte.


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