sábado, 21 de outubro de 2017

"ESTE INFERNO DE AMAR" DE ALMEIDA GARRETT




Este Inferno de Amar
Este inferno de amar - como eu amo! -
Quem mo pôs aqui n'alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida - e que a vida destrói -
 5 Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há-de ela apagar?
Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez... - foi um sonho -
10 Em que paz tão serena a dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar...
Quem me veio, ai de mim! despertar?
Só me lembra que um dia formoso
Eu passei... dava o sol tanta luz!
15 E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? - Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei...


- temática central: manifesto das contradições do amor; 
- "este", pronome demonstrativo sugerindo proximidade; neste caso, remete-nos para o tempo presente;
- constatação de que o amor é um inferno, uma destruição justificada logo no início pela contradição de que este sentimento é algo que alenta e consome; o vocabulário está ligado ao conceito de fogo [destruição] mas também à ideia de que amor é vida;
- podemos considerar três momentos neste poema, correspondendo a cada um deles uma das três estrofes;
- 1º momento - corresponde ao tempo presente, à situação vivida na atualidade pelo sujeito poético; comprovam-no os tempos verbais no Presente do Indicativo;
- o sujeito poético questiona-se sobre a origem daquele sentimento e quando irá ele desaparecer [passado/futuro];
- presença de um paradoxo: o amor dá e tira [contradição];
- antítese
- 2º momento - refere-se ao passado; o ritmo acontece ao sabor dos sentimentos [comprovado pela pontuação];
- o passado referenciado no 2º momento aponta para a fase da vida do sujeito poético anterior ao tê--la conhecido [passado sereno e de paz mas desprovido de vida por não existir amor]; este passado caracteriza-se por ter sido de incerteza];
- perpassa a ideia de sedução, de algo que aconteceu inconscientemente;
- 3º momento - de um passado recente  que é também o do inferno de Amar;
- o contacto faz-se pelo olhar, os olhos são a parte do corpo que o  seduziram, fascinaram, hipnotizaram... o que foi possível apenas por se tratar da mulher-fatal;
- neste 3º momento, o sujeito poético confessa que começou a viver quando a conheceu mas, com ela, chegaram igualmente os sentimentos, o desassossego, a inquietude e tudo o mais que se deveu ao aparecimento da Mulher e do amor; ainda assim, o sujeito poético prefere o presente e justifica-se com o início deste "viver";
- este encontro trouxe-lhe a vida e o inferno de amar; o amor é assim gerador de vida mas manifesta-se pela negativa;
- o encontro do eu com o tu reflete-se na vida do eu: despertar do sonho e acordar para o inferno de amar;
- a pontuação revela o estado de espírito do sujeito poético = frases exclamativas e interrogativas, interjeições, frases de tipo negativo, reticências;
- formalmente, este poema é constituído por 3 estrofes, de seis versos cada, com rima variada e nº variado de sílabas, ao gosto romântico, ao correr dos sentimentos e variação de estados de espírito;
- NOTA: as 2ª e 3ª estrofes possuem características narrativas: narrador autodiegético (narrador na 1ª pessoa e personagem principal); presença de personagens, eu e ela; referência espacial, algures; referência temporal caracterizada como indefinida [saliente-se a escolha dos indefinidos um e outra); existe ação sugerida pelos verbos vivi, dormi, passei, dava...;   
- o eu é vítima da mulher fatal, ela ; amor gerador de conflitos;
- características românticas - tom confessional; indícios de mulher fatal; alusão ao inferno [metáfora]; tom teatral; oposição amor espiritual/amor sensual; transgressão das regras [hibridismo - presença de características líricas e narrativas];
- intertextualidade com Camões e Bocage: o amor é vida e inferno MAS:
** a relação eu/tu afasta-se do tipo de relação em Camões e Bocage onde o amor não era correspondido ou tinha sido correspondido no passado;
- o que motiva esta ideia de o amor ser inferno: a intensidade, o exagero da paixão;
-  EM JEITO DE CONCLUSÃO:



- consideremos a existência de 2 passados e de 1 presente:

o Passado 1 - sem ela; o sonho; a paz; a doçura;

de que ele não sei; não me lembra; talvez um sonho; foi um sonho;

o Passado 2 - com ela; realidade (acordar para o real);

de que ele só me lembra; a viver comecei;

o Presente - com ela; vida; inferno;

e ele - vivo;.





Sem comentários:

Enviar um comentário

COMENTE, SUGIRA, PERGUNTE, OPINE...