Felizmente Há Luar !
O desenrolar da acção gira em
torno da figura, sempre ausente, do general Gomes Freire, mas também sempre tornado
presente pelas outras personagens. (É ele o centro das atenções de todas as
personagens que por ele esperam e dele falam.).
O tema da peça é a tentativa de
conspiração contra o poder totalitário dos Governadores durante a ausência de
D. João VI, vivendo no Brasil, e que foi abafada sob cruel repressão. (Tema histórico,
real).
O bode expiatório foi o General –
a frase de D. Miguel é bem esclarecedora:
“Não há inocentes, Reverência. Em
política, quem não é por nós, é contra nós".
…
O povo, principalmente, aparece
associado à rua; os poderosos, aos interiores.
Podemos considerar:
- a apresentação em grupo (populares
“habitam” o espaço dos que nada têm, a rua).
- dormir no chão = símbolo da
ausência de casa, de abrigo – miséria.
- o acto de catar piolhos – miséria.
É representativo das condições deploráveis em que vivem.
- o acto de fugir às tropas (próprio
de quem conhece a repressão).
- o acto de transportar consigo bens
domésticos (vida sujeita às condições do acaso).
Matilde partilha com os populares
o facto de ser vítima do regime repressivo e o sentimento de perda (ela perde o
amante; o povo perde a esperança de mudança que Gomes Freire representa).
…
O ritmo no Acto II é mais rápido
se pensarmos que decorrem 150 dias e a série de acontecimentos é menor.
A acção decorre durante 150 dias,
o tempo que vai da prisão de Gomes Freire até à sua morte.
Os acontecimentos que decorrem
são a prisão do General e o recurso de Matilde a todas as formas na tentativa
desesperada de o salvar.
…
As três classes que se destacam são o povo, os delatores e os
governadores.
Vicente, numa primeira fase, vive
a mesma fome, a mesma miséria e os mesmos terrores dos seus companheiros. É
mais astucioso e espera uma hipótese de mudança, só conta “meia verdade” aos
outros o que faz com que ganhe a confiança dos Governadores. Através da traição
e da denúncia consegue um posto de Polícia – vende-se pelo preço de um emprego,
perdendo dignidade. Acaba por integrar o grupo de delatores.
Matilde e Sousa Falcão
encontram-se unidos pela fidelidade ao General.
Matilde destaca-se por ser quem luta
com coragem, movida pelo desespero, contra as forças adversas que os
Governadores representam, contra o silêncio do Povo.”Abana” o cinismo dos
Governadores e denuncia, sem sucesso, a injustiça e a tirania.
Sousa Falcão acompanha-a até ao fim,
dominado pela consciência intranquila
/pesada de não ter tido coragem de assumir o que pensava.
O General Gomes Freire é
o protagonista, ainda que nem chegue a entrar em cena. É à volta da sua figura
que toda a acção se desenvolve, pois está omnipresente nas falas, no pensamento
e nas acções das personagens.
No primeiro acto, os populares
movimentam-se à volta da figura do General e dispersam-se à voz de comando dos
polícias. No segundo acto, já não se movimentam, melhor dito, silenciam todo e
qualquer apoio ao seu ídolo, e, simbolicamente, abandonam-no ao seu destino.
Pertencentes ao grupo dos
delatores, são personalidades mesquinhas, que nem os próprios códigos morais
respeitam. No plano dramático, não há evolução, mas no plano narrativo sabemos
que, antes do tempo de acção, já tinham renegado a Maçonaria – a que pertenciam
– e começam a reger-se pelo medo que os leva ao oportunismo.
Beresford é o mais autoritário dos governadores e o detentor de
maior poder – representa o domínio inglês no nosso país.
D. Miguel é prepotente mas servil em relação a Beresford –
representa a nobreza sujeita a forças estrangeiras, devido à ausência do rei D.
João VI.
Principal Sousa – domina
pelo terror em nome de um “Deus feito à imagem e semelhança dos homens” –
representa a interferência da Igreja no Estado.
…
D. Miguel defende, como
sistema, a sua posição de cúpula prepotente, distanciado do povo a quem não
reconhece direito ao diálogo.
Sendo Matilde uma mulher do
povo, D. Miguel manifesta e reitera o seu total desprezo, não apenas em
discurso retórico (acto I), mas em acção na recusa peremptória em receber
Matilde, interpondo um criado para a mandar embora (acto II).
Frei Diogo ousa, subtilmente,
demarcar-se das atrocidades cometidas em nome de Deus. É esclarecido,
representando, por isso, uma oposição silenciosa dentro do Clero.
Felizmente há Luar!
Para D. Miguel o luar simbolizou um
aliado superior como única luz possível para que o povo pudesse contemplar o
castigo / exemplo atroz. Mas é bom lembrar que havia uma lei que proibia as
execuções depois do sol-posto. Portanto, “felizmente” o luar substituiu a
“legalidade” de uma hora solar.
Para Matilde, o sentido é muito mais
vasto: a esperança da mudança para uma nova fase da política e da vida em Portugal,
sabendo que a Lua evolui nas suas diferentes fases. Como reflexo do Sol e ainda
como símbolo do princípio feminino, realiza-se a simbiose com a voz feminina de
Matilde, voz uterina da gestação na esperança de uma revolução concretizada, a
partir do exemplo de um mártir da Pátria.
Ainda a saia verde constitui um
acréscimo importante na mensagem de esperança que, de resto, é também a voz do
próprio Sttau Monteiro.
… mais notas
O espectador/leitor vai-se apercebendo de que o tempo vai passando no acto
II através das várias deslocações de Matilde, com a luz a apagar-se sobre um
espaço para se acender sobre outro, acompanhando a personagem na progressão da
acção.
O contexto social e político que serve de pano de fundo à peça
projecta-se no século XX pelo “efeito de distanciação”. Deste modo, o leitor /
espectador vê-se igualmente projectado nas personagens em acção. A falta de
liberdade de expressão e a censura, durante a ditadura Salazarista levaram o
autor a “proteger-se” na capa de figuras e situações históricas distanciadas
mais de 100 anos, mas muito paralelas.
Meninos:
Apesar de se tratar de um conjunto de respostas a um questionário abrangendo toda a obra, não o considerem desse modo que o tempo urge... :))
Notas soltas, pode ser?
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