terça-feira, 19 de março de 2019

O ANO DA MORTE DE RICARDO REIS - DEAMBULAÇÃO E SIMBOLOGIA DE O ADAMASTOR



Ao longo do romance, Ricardo Reis deambula pela cidade com o único propósito de observar a cidade. Ele será uma espécie de guia que nos dará a conhecer, leitores, o espaço citadino lisboeta que vai observando acidentalmente e que será, naturalmente, objeto da sua visão crítica.
Lisboa é descrita como uma cidade envolta pela chuva, triste, cinzenta, sem qualquer atrativo, deserta e imóvel numa metáfora do regime do Estado Novo, que cerca os seus cidadãos, maioritariamente “súbditos, escravos, submissos, reprimidos, oprimidos”, sem vontade para lutar e para sair da situação em que se encontra.
Na sua deambulação pela cidade, Ricardo Reis adota a atitude de observador acidental já conhecida de Cesário Verde, mas evidenciando a sua costela crítica a fazer lembrar o Eça de Os Maias quando, no final do romance, se refere à estagnação de Lisboa – Portugal - passados dez anos.
“A deambulação geográfica nesta obra é igualmente uma viagem literária e quando Ricardo Reis se embrenha no labirinto da cidade, é nas suas personalidades culturais que encontra os marcos norteadores do caminho. Assim, a viagem geográfica cruza-se com a viagem literária e as alusões constantes a Luís de Camões, a Eça de Queirós e ao próprio Fernando Pessoa, autor da Mensagem, ou aos heterónimos, completam a revisitação de Ricardo Reis a Lisboa, (…)”
Pontos da cidade mencionados são o monumento ao Adamastor – um dos preferidos de Ricardo Reis e perto do qual habita, simboliza os obstáculos do passado, opositor à marcha dos portugueses, representando no romance a aurora de uma sociedade nova – o Rossio, a Baixa ou a Praça do Comércio. Com Ricardo Reis partimos do Cais do Sodré, seguimos pela Rua do Alecrim até ao Largo do Barão de Quintela, chegamos ao Largo de Camões, ao Alto de Santa Catarina, ao Chiado.
Os passeios pela cidade, as digressões pelo espaço labiríntico da cidade são igualmente viagens efetuadas através de um “eu”, que para elas encontra inspiração nas deambulações pela capital. Camões constitui o elemento orientador, o guia dos poetas em geral e de Ricardo Reis em particular.

O Gigante Adamastor

Caixa de texto: Simbolicamente, o número 7 corresponde ao Antigo Testamento; o número 8 pertence ao Novo Testamento, anunciando o Futuro.


No romance, a estátua do Adamastor é, assim como a estátua de Camões, um marco norteador dentro do labirinto da cidade de Lisboa. Geograficamente, o Adamastor encontra-se num ponto de cruzamento de caminhos. O Adamastor, símbolo de todos os obstáculos, no passado, torna-se no presente a rosa-dos-ventos, que anuncia o novo roteiro do povo. Assim, nas coordenadas do texto, sendo a confluência das 8 direções cardeais, ilumina duplamente o horizonte de expetativas humanas e anuncia um mundo novo.

Oito anos após a partida de Ricardo Reis para o Brasil, o monumento foi erigido.
Oito anos depois de estar no Alto de Santa Catarina, Ricardo Reis regressa à pátria.
O Adamastor simboliza as dificuldades / obstáculos que o homem tem de ultrapassar para atingir os seus objetivos e tem, no romance, a função de representar as forças opressoras da ditadura.



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