Tabacaria, poema datado de 15/1/1928, pertence, por assim dizer, à fase "intimista", ou terceira fase, da obra poética de Álvaro de Campos, caracterizada por um profundo pessimismo e marcante angústia onde o poeta mergulha, retomando temas como o cansaço e a inquietação quando confrontado com o incompreensível.
Talvez por isso, Tabacaria é o melhor exemplo desta fase de Álvaro de Campos e de várias outras características do conjunto da sua obra.
Igualmente importantes e presentes são o "niilismo, o sentimento de revolta, o inconformismo, a desumanização, um vazio deprimente e a desilusão própria dos tempos do pós-guerra e de um certo desleixo português".
Na abordagem a este poema, há a considerar a existência de uma Introdução e de um Desenvolvimento o qual, por sua vez, é constituído por 4 momentos em que se estabelece a relação do "eu" com os espaços físicos:
DENTRO
- o quarto (cadeira) / fora (janelas)
- deslocação espacial do "eu" poético.
Na abordagem a este poema, há a considerar a existência de uma Introdução e de um Desenvolvimento o qual, por sua vez, é constituído por 4 momentos em que se estabelece a relação do "eu" com os espaços físicos:
DENTRO
- o quarto (cadeira) / fora (janelas)
- deslocação espacial do "eu" poético.
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a põr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo. ( este verso conclui sobre as referências anteriores)
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
1ª momento a considerar (vv. 5-31)
O "eu" reflete sobre o excesso de realidade do mundo exterior - Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é; cruzada constantemente por gente,
e a irrealidade de tudo - uma rua inacessível ; impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa, Com o mistério das coisas.
Neste 1º momento, o "eu" encontra-se à janela do seu quarto, única forma de contactar com o exterior e que se encontra representado no poema pela "rua" e pela "tabacaria".
O Destino surge aqui associado à ideia de Morte (vv.12-13), considerado um tirano que domina tudo e todos - Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Por sua vez, há um claro pessimismo a invadir o "eu", ligado ao desgaste do Tempo e à morte que se tem como certa - Com a morte a põr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens, / Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Anáfora. O negativismo do "eu" é assumido nos versos que se seguem à anáfora.
Estamos perante um "eu" contemplativo, invadido por uma oposição; por um lado, o "dentro" representado pelo quarto onde se encontra, subjetivo, campo da sua própria reflexão, e a rua, o "fora", a realidade objetiva.
A reflexão a que o "eu" poético se sujeita, deprime-o, - Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade. assim como a incapacidade de sonhar e a lucidez - Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
Afinal, a oposição - o dentro/o fora - que o divide é resultado da sua própria incapacidade para agir mesmo depois de ter pensado, refletido e tirado conclusões. Regressa, por isso, ao texto, À Tabacaria do outro lado da rua..."
Talvez influenciado pelo seu Mestre Caeiro, recorre à Natureza em busca de um sentido -
Fui até ao campo com grandes propósitos.
visto que esqueceu tudo aquilo que aprendeu e que se revelou inútil - Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada. / A aprendizagem que me deram, .
No entanto, esta busca revela-se também ela inútil pois o "eu" é um homem da cidade, lúcido e angustiado - Mas lá encontrei só ervas e árvores, / E quando havia gente era igual à outra.
Deste modo, o "eu" regressa à reflexão como o demonstra o primeiro verso do 2º momento - Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei-de pensar? - e último da 5ª estrofe.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Estes quatro versos constituem a Introdução ao poema.
Nela, o "eu" confessa o seu fracasso, apresenta-se como algo sem solução. Na base desta confissão sugere-se uma outra ideia, a de que o "eu" pretende ser tudo como possibilidade (v.4).
Será esta a temática ou linha orientadora deste poema,
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a põr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo. ( este verso conclui sobre as referências anteriores)
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
1ª momento a considerar (vv. 5-31)
O "eu" reflete sobre o excesso de realidade do mundo exterior - Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é; cruzada constantemente por gente,
e a irrealidade de tudo - uma rua inacessível ; impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa, Com o mistério das coisas.
Neste 1º momento, o "eu" encontra-se à janela do seu quarto, única forma de contactar com o exterior e que se encontra representado no poema pela "rua" e pela "tabacaria".
O Destino surge aqui associado à ideia de Morte (vv.12-13), considerado um tirano que domina tudo e todos - Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Por sua vez, há um claro pessimismo a invadir o "eu", ligado ao desgaste do Tempo e à morte que se tem como certa - Com a morte a põr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens, / Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Anáfora. O negativismo do "eu" é assumido nos versos que se seguem à anáfora.
Estamos perante um "eu" contemplativo, invadido por uma oposição; por um lado, o "dentro" representado pelo quarto onde se encontra, subjetivo, campo da sua própria reflexão, e a rua, o "fora", a realidade objetiva.
A reflexão a que o "eu" poético se sujeita, deprime-o, - Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade. assim como a incapacidade de sonhar e a lucidez - Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
Afinal, a oposição - o dentro/o fora - que o divide é resultado da sua própria incapacidade para agir mesmo depois de ter pensado, refletido e tirado conclusões. Regressa, por isso, ao texto, À Tabacaria do outro lado da rua..."
Talvez influenciado pelo seu Mestre Caeiro, recorre à Natureza em busca de um sentido -
Fui até ao campo com grandes propósitos.
visto que esqueceu tudo aquilo que aprendeu e que se revelou inútil - Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada. / A aprendizagem que me deram, .
No entanto, esta busca revela-se também ela inútil pois o "eu" é um homem da cidade, lúcido e angustiado - Mas lá encontrei só ervas e árvores, / E quando havia gente era igual à outra.
Deste modo, o "eu" regressa à reflexão como o demonstra o primeiro verso do 2º momento - Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei-de pensar? - e último da 5ª estrofe.
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